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Mulheres Em Brasília denunciam feminicídios e a omissão do Estado

Direitos Humanos

Milhares de pessoas, desafiando a chuva forte, reuniram-se no centro de Brasília para participar do ato “Levante Mulheres Vivas”. A manifestação, que ecoou em diversas capitais brasileiras, teve como objetivo central denunciar a crescente violência contra a mulher, os alarmantes casos de feminicídio e a percepção de omissão por parte do Estado na proteção e prevenção da violência de gênero. Lideranças, ativistas e figuras públicas, incluindo ministras e a primeira-dama, Janja Lula da Silva, uniram suas vozes para exigir ações concretas. O evento em Brasília transformou a Torre de TV em um palco de protesto e conscientização, destacando a urgência de uma resposta efetiva diante de uma “epidemia” de violência que abala o país.

O levante nacional contra a violência de gênero

A mobilização nacional do “Levante Mulheres Vivas” foi convocada por dezenas de organizações femininas em resposta a uma série de feminicídios brutais que chocaram o Brasil nos últimos dias. Casos como o de Tainara Souza Santos, que teve as pernas mutiladas após ser atropelada e arrastada, o assassinato a tiros de duas funcionárias do Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet-RJ) por um colega, e o encontro do corpo carbonizado da cabo do Exército Maria de Lourdes Freire Matos, cujo assassinato está sendo investigado como feminicídio, serviram como estopim para o clamor popular. Em Brasília, a manifestação reuniu um público significativo sob forte chuva, mas a participação não foi intimidada pelas condições climáticas.

Vozes na linha de frente: denúncias e rimas

No epicentro do protesto em Brasília, falas contundentes de lideranças e apresentações culturais movimentaram a Torre de TV. Elisandra “Lis” Martins, assistente social de 31 anos e integrante do coletivo Batalha das Gurias, da Frente Nacional de Mulheres no Hip-Hop, usou sua arte para denunciar a violência de gênero, expressando a esperança de provocar uma reação do Estado. Com rimas impactantes, ela declarou: “Estupros corretivos, tapas e facadas. Querem nos manter de bocas fechadas, mas nem a morte irá nos calar. Mulheres vivas!”. Moradora do Itapoã, região administrativa do DF, Lis Martins também abordou a interseccionalidade das violências: “É violência de gênero, é violência de raça, por esses motivos temos as nossas vidas escassas, é como viver no submundo dos empregos, periferias e até do próprio mundo. Da não aceitação até a depressão que nos mata, mantendo viva a respiração”. O ato contou com a presença de um ministro e seis ministras, entre elas Cida Gonçalves (Mulher), Anielle Franco (Igualdade Racial) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), além de deputadas federais e da primeira-dama Janja Lula da Silva, reforçando o apoio institucional à causa.

A falha do estado e o sistema de justiça

Durante o protesto, foram recorrentes as críticas à omissão e à alegada incapacidade das instituições estatais de protegerem mulheres vítimas de violência e prevenirem esses crimes. A doutora em ciências sociais e ativista Vanessa Hacon, do Coletivo Mães na Luta, que assessora mulheres vítimas de violência, apontou falhas graves no sistema de Justiça. Segundo ela, este é negligente no atendimento às mulheres e, na maioria dos casos, culpabiliza a própria vítima. “As mulheres saem de casa para se livrar da violência doméstica e vão parar dentro do sistema de Justiça, onde a violência processual é intensa e absurda e os juízes não fazem nada”, afirmou Hacon. A ativista também criticou a dificuldade de obtenção de medidas protetivas, consideradas essenciais para a segurança das mulheres.

A crítica ao patriarcado e a busca por mudança estrutural

Vanessa Hacon denunciou a existência de uma “ideologia machista nos tribunais” que, segundo ela, deslegitima denúncias com base em estereótipos de gênero. “Essa mulher é uma ressentida”, “não aceita o fim do relacionamento”, “vingativa” são exemplos de argumentos que, na sua visão, levam ao arquivamento de casos sob justificativas vagas, em vez de um processamento correto. Com gritos como “Feminismo é revolução” e “Mulheres Vivas”, as manifestantes destacaram que a estrutura patriarcal da sociedade, desenvolvida ao longo dos séculos, contribui para uma “epidemia” de feminicídios no Brasil. Leonor Costa, militante do Movimento Negro Unificado (MNU), explicou que o patriarcado se manifesta na lógica de que o gênero masculino detém o poder central na sociedade. Ela enfatizou que os recentes casos de feminicídio acenderam a revolta das mulheres pelo país, e expressou a esperança de que os atos “sensibilizem a sociedade e mostrem o perigo que as mulheres vivem no seu cotidiano e, mais do que isso, que sensibilize o Estado”. Para Costa, são fundamentais políticas públicas capazes de frear a violência e, crucialmente, políticas de educação que conscientizem a sociedade de que este é um problema nacional, não apenas de um grupo específico.

Mobilização e perspectivas futuras

Embora a maioria dos presentes na manifestação fosse composta por mulheres, a presença de homens foi notável, e as lideranças destacaram a importância de sua participação na luta contra a violência de gênero. A escritora, cineasta e professora aposentada Renata Parreira sublinhou a necessidade de “convocar os homens a discutir, a refletir sobre sua masculinidade tóxica”. Ela defendeu que os homens devem ser aliados nessa luta, que é de todos, para transformar o projeto de sociedade. Para Parreira, que integra o Levante Feminista contra o Feminicídio, Lesbocídio e Transfeminicídio, é igualmente essencial reforçar o orçamento público destinado ao combate à violência de gênero. “Sem orçamento público, sem equipe qualificada, sem indicadores econômicos e sociais de pesquisa não há como elaborar políticas públicas efetivas para a prevenção da violência de mulheres”, afirmou, ressaltando que a educação é a chave para mudar a cultura dinâmica da sociedade.

O impacto econômico e social da violência

A situação econômica das mulheres foi outro fator levantado durante o ato como elemento que alimenta a violência de gênero. Aline Karina Dias, empreendedora de 36 anos, considera a questão financeira uma ferramenta vital para a emancipação de muitas mulheres dos ciclos de violência e exclusão. “Compreendemos o empreendedorismo, a questão financeira, como uma ferramenta de emancipação e de existência das mulheres. Muitas que sofrem feminicídio são devido a questões sociais, por falta de moradia e de emprego”, explicou Dias, que lidera o Sebas Turística, um projeto de afroturismo de base comunitária em São Sebastião, DF. Dados recentes pintam um quadro alarmante: em 2024, 1.459 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil, uma média de aproximadamente quatro assassinatos por dia devido ao gênero. As estatísticas mais recentes já apontam para mais de 1.180 feminicídios registrados no país, e a capital paulista, em particular, já reportou um número recorde de casos para um ano. Estima-se que cerca de 3,7 milhões de mulheres brasileiras tenham vivido um ou mais episódios de violência doméstica nos últimos 12 meses, conforme o Mapa Nacional da Violência de Gênero.

O “Levante Mulheres Vivas” em Brasília, e em todo o país, reforça a urgência de uma mudança profunda na forma como a sociedade e o Estado encaram a violência de gênero. As vozes das ativistas, líderes e cidadãs ecoam um clamor por justiça, proteção e por um futuro onde o patriarcado não dite o destino das mulheres. Mais do que um protesto pontual, o ato representa um marco na luta contínua por políticas públicas eficazes, educação transformadora e um sistema de justiça que verdadeiramente sirva às vítimas. A mobilização em Brasília sublinhou que combater o feminicídio exige um esforço coletivo, envolvendo homens e mulheres, e um compromisso irrestrito do poder público em todas as esferas. A mensagem é clara: nem a morte calará a busca por “mulheres vivas”.

FAQ

O que foi o “Levante Mulheres Vivas” em Brasília?
Foi um ato de protesto massivo realizado no centro de Brasília, em conjunto com outras capitais, para denunciar a violência contra a mulher, o feminicídio e a omissão do Estado na proteção e prevenção da violência de gênero. O evento foi motivado por uma série de feminicídios recentes que chocaram o país.

Quais foram as principais denúncias levantadas no ato?
As denúncias incluíram a violência direta contra mulheres, a falha do sistema de justiça em proteger as vítimas e em processar corretamente os agressores, a influência do patriarcado na sociedade e a necessidade de políticas públicas e orçamentos adequados para combater o problema.

Qual o papel do Estado e do sistema de justiça na prevenção do feminicídio, segundo as manifestantes?
Segundo as manifestantes, o Estado e o sistema de justiça têm sido negligentes, falhando em conceder medidas protetivas e em levar a sério as denúncias, muitas vezes culpando a própria vítima ou arquivando casos com base em estereótipos machistas. Exige-se maior eficácia e compromisso na proteção e na prevenção.

Por que a questão econômica é relevante para a violência de gênero?
A situação econômica desfavorável, como a falta de moradia e emprego, pode prender mulheres em ciclos de violência e exclusão. A emancipação financeira é vista como uma ferramenta crucial para que as mulheres possam se libertar de relacionamentos abusivos e construir uma vida digna e segura.

Para aprofundar seu conhecimento sobre o combate à violência contra a mulher e descobrir como você pode se engajar, visite portais de notícias confiáveis e organizações de direitos femininos.

Fonte: https://agenciabrasil.ebc.com.br